sexta-feira, fevereiro 03, 2006

 

Quadro a quadro

A notícia é breve: o cine Estação Paissandu, do Rio de Janeiro, foi interditado por fiscais da Prefeitura. A vistoria verificou que o estabelecimento funcionava sem o alvará de licença, além de comprovar outras cinco irregularidades. Ou seja, um verdadeiro Cine Poeira...
Não sei se o endereço deste cinema, na Rua Senador Vergueiro, coincide com o que conheci e que foi o templo do Cinema Novo, território livre de Glauber Rocha e sua turma. Um dos poucos cinemas brasileiros de arte.
No Cine Paissandu, sede do Festival de Cinema JB/Mesbla,em 1968, minha vida podia ter tomado outro rumo. Meu documentário São Thomé das Letras, em 16 mm era considerado o melhor, sério candidato ao prêmio de melhor na opinião de Afonso Beato, grande fotógrafo dos filmes cinemanovistas e de Geraldo Sarno, documentarista.
Este foi um ano terrível, o ano do AI-5, em que todas as bruxas andaram soltas! Doce Amargo, de André Luiz Oliveira foi premiado em primeiro lugar, não por que fosse o melhor, mas por ser o mais panfletário.
Assistir esta lúdica invenção dos irmãos Lumiére tinha sido uma constante na minha vida, desde que minha irmã Sueli me levava ao Festival Tom & Jerry, em Governador Valadares.
Em Lavras, enfrentei o Cine Municipal, que funcionava em um antigo e glamouroso teatro que despencava sobre nossas cabeças, para assistir na matinê de domingo a série do Fu Manchu. Depois foi o Cine Aparecida, o Ipê, o Brasil e o Rio Grande e muitos filmes que a gente nem sabia que eram de arte.
Em Beagá meu ponto obrigatório era na cabine especial do Cine Brasil, onde assistíamos os filmes e fazíamos a crítica para os jornais. Antônio Luciano, um baixinho bilionário, dono de todos os cinemas de Beagá, descia do seu escritório e entrava na pequena sala depois que as luzes se apagavam, sem cumprimentar a pequena platéia...
Foram centenas, milhares de filmes que assisti, dentre eles: Casablanca; 2001-Uma odisséia no espaço; Cidadão Kane; O sétimo selo; Encouraçado Potemkin; Juventude transviada;Luzes da ribalta; A malvada; Morangos Silvestres; Acossado; Deus e o Diabo na terra do Sol;Morte em Veneza; Blow-up; Tempos Modernos; O último selo e, Fellini Oito e Meio.
Estes são os que me vem à memória agora...Hoje o cinema foi sobrepujado pelo ato solitário de encadear idéias e colocá-las no computador, numa luta intestina contra o branco intenso da tela...Mas dou minhas escapadas para assistir um ou outro filme no Centerplex do Lavrashopping, porque se um dia vierem a fechá-lo por falta de público, não quero estar no rol dos culpados.
Foi assim que vi O jardineiro Fiel, de Fernando Meirelles, com Rachel Weisz, e Ralph Fiennes. Adaptado de um romance de John le Carré. Primeiro trabalho internacional de Fernando Meirelles. Um c... de miúra, como Mário Fiorani, classificava filmes que eram difíceis de engolir. Dormi no cinema, o saco de pipocas derramado na poltrona...
O outro foi o filme de Breno Silveira, Os 2 filhos de Francisco, que conta a trajetória de Zezé Di Camargo (Márcio Kieling) e Luciano (Thiago Mendonça) a partir do sonho de seu pai, Francisco Camargo (Ângelo Antônio). Muito bem feito. Pena que no final tenhamos que conviver com o canastrismo do verdadeiro Luciano...
Para terminar um show de entretenimento: King Kong. Escrito, dirigido e produzido por Peter Jackson, com Naomi Watts, um sensacional gorilão e muitas cenas de animação computadorizada!. Três horas de pura aventura, as cenas acontecendo sem que possamos respirar. Ótimo divertimento! O primeiro filme é de 1933 e Inicialmente era para ser intitulado Kong. Acrescentaram merecidamente o King e tornou-se um sucesso absoluto. Na verdade King Kong recria a fábula da Bela e a Fera que sobrevive no inconsciente coletivo... Hoje até poderia voltar a fazer cinema quadro a quadro mas sinto engulhos com a luta insana entre os homens da cultura oficial, com o Ministro Gilberto Gil à frente, que querem transformar tudo em pura indústria da diversão e líderes do movimento do cinema novo, como Luiz Carlos Barreto e Zelito Vianna. Rixas de subdesenvolvimento..
Doces ilusões da lanterna mágica....

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